Ex-paquita Stephanie Lourenço explica decisão de expor homofobia: “Reprimi”

Stephanie Lourenço, 37, fez uma viagem ao passado em 2024 no documentário “Pra Sempre Paquitas”, do Globoplay, no qual lembrou os três anos em que integrou o grupo de assistentes de palco de Xuxa Meneghel. Em entrevista à CNN, ela fez uma avaliação da carreira mirim sem mostrar arrependimentos. A curitibana ainda falou sobre a relação com a sexualidade e novos projetos na vida profissional.

Entre os diversos problemas abordados pelo documentário, a homofobia sofrida por Stephanie nos bastidores do programa infantil foi um deles. A atriz, que falou publicamente sobre a bissexualidade em 2022, contou como surgiu a ideia de abordar o assunto:

“Eu me assumi algum tempo antes do documentário. Foi um momento muito importante para mim. Então, na pré-entrevista e na entrevista, essa questão surgiu de maneira natural. Era algo que eu queria muito abordar e o Paulo Mário, roteirista, também. Ele é um homem gay que se identificou com a minha história. Eu, uma mulher bissexual com ânsia de falar sobre algo que aconteceu comigo. Acabou acontecendo de um jeito bem bonito entre a gente. Nos emocionamos e nos conectamos.”

Ela tinha 12 anos quando foi chamada de “sapatão” de forma pejorativa nos bastidores, e contou que não tinha noção da gravidade da situação na época. “Eram assim que as coisas aconteciam. E ponto. A televisão funcionava desse jeito e eu sabia que tinha que estar preparada para todo aquele turbilhão. Acreditávamos nisso”, explicou.

A jornada de autodescoberta levou alguns anos, mas hoje Stephanie exibe as cores da bandeira LGBTQIA+ com orgulho em uma tatuagem nas costas. “Eu me entendia como uma menina lésbica aos 14 anos. Depois, a vida foi acontecendo e me oprimindo. Me afastei de minha essência. Cheguei a acreditar que era heterossexual por um momento, porque deixava todo mundo feliz e tudo menos complicado”.

“Quando me assumi como bissexual, foi porque aconteceu algo muito potente que é você se libertar e dar vazão a quem você é, não consegui mais conter e tive que verbalizar. Quando a sua identidade bate na sua porta é algo muito potente. Não tem como conter. Foi isso que aconteceu”, lembrou.


Atriz e ex-paquita Stephanie Lourenço
Stephanie Lourenço • Muraca

O apoio de algumas pessoas do programa também foi essencial para a formação da atriz. “Na época de Paquita, eu convivi com pessoas da comunidade que me deram muito apoio. A Mariana Richard [uma das Irmãs Metralha], por exemplo, que aparece no documentário. Sempre estive rodeada de pessoas LGBT, até pela minha profissão, mas por algum motivo eu reprimi esse meu lado por muitos anos”.

Eu também fiquei surpresa com o que fui capaz de fazer comigo mesma. Nunca esperava que iria me oprimir. Sempre me achei muito livre. Mas, às vezes, a gente compra a ideologia que dita para a gente o que é ‘normal’ porque é algo que está enraizado no nosso cotidiano e causa menos incômodo. Mas as pessoas da comunidade que me rodearam sempre foram muito importantes para mim, mesmo que eu tenha descoberto dessa importância mais tarde”.

No documentário, a ex-assistente de palco lembrou que o nervosismo tirou as palavras de sua boca ao ver Xuxa pessoalmente pela primeira vez. Décadas depois, o sentimento de deslumbramento continuou o mesmo: “Sempre fico admirada com a Xuxa que foi meu ídolo de infância, minha colega de trabalho tão exemplar e hoje uma mulher que luta por ideais tão nobres como a causa LGBT, contra etarismo, contra a violência a crianças, pelo veganismo etc. Ela sempre vai me causar esse efeito de admiração. A presença dela sempre vai me causar um impacto”.

Ela ainda falou com determinação sobre sua maior referência: “Cássia Eller, Cássia Eller, Cássia Eller. Essa mulher foi tudo para mim. Assisti a quase uns dez shows dela na época e ali me sentia representada e livre. Ela não se desculpava por ser quem era. Simplesmente existia e sua existência era revolucionária. Jamais me esquecerei”.

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Quando decidiu falar sobre a bissexualidade, Stephanie recebeu o apoio dos fãs, mas também foi bombardeada por críticas. “As redes sociais muitas vezes me fazem perder a esperança na humanidade, sério. Às vezes, procuro sarna para me coçar, então resolvo ler comentários, mas não recomendo. Essas pessoas não te conhecem, não sabem da sua história, das suas dores. Fico chocada, mas hoje em dia muito menos. Li comentários de pessoas que disseram que eu não sou ninguém e abordei a minha bissexualidade para sair do ostracismo (risos). Seja lá o que isso signifique. Li comentários maldosos, mas engraçados, como: ‘Na BR-116 não se fala em outra coisa’ e ri”.

“Também recebi muitas mensagens de pessoas da comunidade me agradecendo pelo meu depoimento. Pessoas que já se assumiram, algumas que ainda sentem medo, um homem bissexual que se assumiu depois de me ouvir. E isso no final é o que vale. Me sinto conectada com essas pessoas. Me sinto honrada por confiarem em mim”, avaliou.


Atriz e ex-paquita Stephanie Lourenço
Stephanie Lourenço • Muraca

Questionada sobre os planos caso não tivesse se tornado paquita, Stephanie não soube responder. “Não consigo e nem quero imaginar. Sou resultado de tudo o que vivi. Uma fala clichê, mas muito real: ter passado por tudo o que passei, deixado minha infância superprotegida para trás, me trouxe muitos desafios e possibilidades de crescimento e evolução. Hoje gosto de mim. Algo que demorei para conquistar”.

A atriz trabalha em um curta-metragem que sucede a peça “O que meu Corpo Nu te Conta”, dirigida por Marcelo Varzea em 2022. “Não é fácil transpor uma experiência do palco para o audiovisual. Estou penando um pouco, mas vai valer a pena. Toda essa pesquisa é muito enriquecedora e sei que quando o projeto for concluído terei crescido muito com ele. Eu já reescrevi o roteiro mais de dez vezes. A ideia é que o projeto esteja finalizado até março e espero que viaje um pouco o Brasil e o mundo em alguns festivais. Torcendo para que isso aconteça”, adiantou.

A produção aborda o vício em remédios de forma lúdica. “Nem sempre podemos selecionar nossos projetos ou temos dinheiro para bancar uma ideia nossa. Mas, dessa vez, conto com o apoio de muitos amigos talentosos que embarcaram nessa ideia. Falar sobre temas queridos para mim faz parte da minha trajetória como artista. Mas sabemos que estamos à mercê do mercado na maioria das vezes. E eu quero trabalhar, trabalhar, trabalhar. Às vezes, damos sorte e encontramos um(a/e) diretor(a/e) com objetivos próximos aos nossos e isso é incrível”.

“A arte, além do entretenimento, causa empatia, aproximação. Chegamos perto e nos comovemos com histórias que estão longe de serem parte da nossa realidade cotidiana, mas fazem parte do mundo em que vivemos. Por isso acho importante”, defendeu a atriz e ativista.

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Este conteúdo foi originalmente publicado em Ex-paquita Stephanie Lourenço explica decisão de expor homofobia: “Reprimi” no site CNN Brasil.

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